Perdas e ganhos - Suely Caldas
O Estado de S. Paulo - 29/08/2010
Na página 11 da apresentação feita há dez dias à imprensa, pelo ministro Guido Mantega, sobre lucros e perdas dos empréstimos do Tesouro ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), constava um quadro intitulado Estimativas de custos e benefícios fiscais, em que os custos foram calculados em R$ 48,2 bilhões e os benefícios, em R$ 79 bilhões, com resultado positivo de R$ 30,8 bilhões. A apresentação inteira, com este quadro inclusive, estava no site do BNDES até pouco antes da coletiva do ministro, naquela tarde de 19 de agosto.
Misteriosamente, sem nenhuma explicação, ela foi retirada do ar e assim ficou durante toda a coletiva. Num passe de mágica, duas horas depois, ela voltou ao site, mas desta vez sem o valor de R$ 48,2 bilhões dos custos, só com os R$ 79 bilhões dos benefícios. Mesmo sem saber da troca (revelada agora neste texto), os jornalistas reclamaram. Afinal, se era para explicar perdas e ganhos, como ignorar as perdas e mostrar só os ganhos? O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, respondeu que, quando chegassem à redação, poderiam ver a apresentação inteira no site do banco. E viram, mas adulterada, sem as perdas quantificadas.
Ou seja, para esconder o que não convém, vale enganar o País. E pensar que a confidência feita pelo embaixador Rubens Ricupero, de "esconder as coisas ruins e mostrar só as boas", custou-lhe o cargo de ministro da Fazenda em 1994!
Mas a manobra dos números vai longe. Na verdade, a estimativa de perda para o Tesouro de R$ 48,2 bilhões teve por base apenas o valor de R$ 100 bilhões do primeiro empréstimo de 2009, muito antes do segundo, de R$ 80 bilhões, de abril deste ano. Até as paredes do gabinete de Luciano Coutinho sabem disso. E não precisa ser nenhuma sumidade em matemática para concluir que o cálculo da perda sobre os dois créditos somados (R$ 180 bilhões) seria bem maior do que a limitada a R$ 100 bilhões. Mas na planilha que saiu do ar os benefícios são calculados sobre R$ 180 bilhões e os custos, sobre R$ 100 bilhões. É uma equação enganadora e mesmo assim foi retirada da internet.
Qualquer leigo em matemática sabe que, num crédito que custa 10,75% da Selic para o credor (o Tesouro) e 6% da TJLP para o tomador (BNDES), quem sai prejudicado é o credor - no caso, os brasileiros (ricos e pobres), que pagam impostos e sustentam o governo. Apesar disso, na apresentação para a imprensa, Mantega e Coutinho usaram premissas frágeis para chegar ao resultado desejado de contabilizar mais ganhos do que perdas. Por exemplo, imaginaram que a Selic e a TJLP irão convergir em 2018, quando a diferença de taxas e o prejuízo do Tesouro desapareceriam. Puro exercício de adivinhação.
A estimativa mais distante do mercado para a Selic é de 10% em 2014 (hoje é de 10,75%). Se em quatro anos vai recuar só 0,75%, alguém acredita que baixará 4% em três anos? Além disso, a experiência tem mostrado que a TJLP cai sempre que o Banco Central (BC) reduz a Selic. Sem dúvida, uma premissa insustentável.
Razão tem o presidente do BC, Henrique Meirelles, quando diz que esses empréstimos só retardam a queda dos juros no País.
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