Friday, March 10, 2017

A Zunzurinha de Zunz: Lutero, Goethe, e a Emancipação Judaica

Antes de Goethe o alemão representativo era um sujeito bonachão, analfabeto, religioso, grosso, decente, bebedor de cerveja de hábitos suínos e uma dedicação fervorosa ao trabalho. Lutero compartilhava essas características, exceto o analfabetismo. Lutero era o homem mais ilustrado do seu tempo, de cultura imensa apenas comparável, entre seus contemporâneos, a Erasmo e Maquiavel. Mas Lutero não era um homem vão, vaidoso e muito menos pedante. Apesar da enorme cultura se soltassem Lutero no meio da pradaria nebraskiana ou no hill country texano ele passaria facilmente por um típico red neck: sujeito honrado, honesto, pai de família, trabalhador, temente a Deus e, portanto, com total aversão a corrupção moral do petralhismo americano do partido democrata.

Goethe tentou mudar a alma do alemão. Uma de suas invenções foi o ideal de Bildung de progresso individual através da literatura, artes e filosofia. Bildung sintetizava duas correntes aparentemente opostas, o progresso do iluminismo e a individualidade do romantismo. Na Alemanha esse ideal se transformou numa espécie de doutrina nacional em que todo o populacho deveria se esforçar para alcançar e compartilhar da “alta cultura”. O maçante Effi Briest de Theodor Fontane mostra o efeito da “alta cultura” na sociedade alemã, cadinho de porcelana da enorme chatice, mediocridade e pomposidade artificial tedescas.

Curiosamente o ideal Goetheniano teve maior repercussão entre a minoria Judaica alemã. Por volta de 1819, quando os Judeus iniciavam sua emancipação, um grupo chamado Wissenschaft começou o que mais tarde seria chamado de judaismo reformado. Basicamente a idéia era integrar o judeu do gueto na sociedade alemã. Era um esforço civilizatório. Leopold Zunz, um dos líderes do Wissenschaft, apresentou algumas críticas e dicas para o aprimoramento moral, intelectual e social dos Judeus, chamado Judenubel [trema no u]. Elas aparecem no livro de Amos Elon, The Pity of It All. Listo algumas delas: Superstição; aversão ao trabalho manual; preferência por cerimônias; pão durismo; cambalacho; ganância; desprezo pela ciência; achar permissível enganar os não-Judeus; costumes obsoletos; rabinos tirânicos; esmolas gastas para sustentar vagabundos; escolas que só ensinam religião; negligência da língua pátria; crianças afeminadas e mal educadas; discriminação das mulheres; grosseria.

O ideário de Zunz é inconciliável, exatamente o reverso do multiculturalismo. No nosso mundo politicamente correto Zunz seria no mínimo chamado de nazista.

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