A arte sacra da renascença representa o cristianismo como manancial de luz e salvação. Seus querubins rosadinhos voam como pombas, suas doces madonas acariciam, esparramando amor, rechonchudos meninos Jesus, e seu cristo, mesmo sob tortura, é representado com pureza, leveza e fulgor. Contudo, essa luz renascentista não penetra no mundo ibérico. Enquanto a Espanha dilapida a riqueza roubada das Américas sua alma padece numa escuridão perpétua, imortalizada pela obra de São João da Cruz, A Noite Escura. Para ele o caminho de Deus é tenebroso, aterrorizante. Só o sofrimento salva. Sua visão, mais pesada do que a de Thomas a Kempis, mostra que nas profundezas do desespero causado pela negação do mundo, de tudo o que amamos, da nossa força de vontade é onde encontramos a fé e a redenção. A supressão do Eu, a submissão total, é fundamental para encontrar Deus.
Se a fé para os protestantes é um dom divino, quase uma loteria, para o catolicismo espanhol ela resulta de muito exercício espiritual necessário para mergulhar numa experiência mística que prepara e permite ao indivíduo encontrar e realizar a fé. Santo Inácio de Loyola foi perseguido exatamente por ensinar e divulgar sua ginástica espiritual, portão de entrada do misticismo. Mas mesmo quando esse esforço é bem sucedido, ele é pontuado por uma extrema tristeza que perfila nossa cultura ibérica, aparente no fado Português e no caráter nacional e vazio da alma do brasileiro.
Na entrada de Auschwitz há o slogan do socialismo nacionalista “Só o Trabalho Liberta” [Arbeit Macht Frei]. Essa é uma das crenças socialistas mais enraizadas e populares. Eles repisam que a melhor punição para criminosos é a educação e a melhor educação é o trabalho. Prisões devem ser escolas cujo fim é transformar homens, semear virtudes. Tal idéia foi levada em prática pela primeira vez pelos socialistas internacionalistas [Bolcheviques]. Ela criou o imenso arquipélago Gulag. Esse Sistema prisional era visto como um sistema educacional. Se um indivíduo não é um bom cidadão, i.e., não obedece cegamente ao partido, então ele deve ser reeducado no Gulag. Essa prisão não prende ou pune, mas liberta, porque educa os inimigos do regime com o trabalho forçado. Se o trabalho é forçado, o prisioneiro é um escravo do partido. Mas na lógica dialética, a escravidão liberta, porque educa e transforma o indivíduo de inimigo a entusiasmado apoiador do regime, que é a definição comunista de cidadão. Em suma, só a submissão total e irrestrita ao partido salva.
Notem aqui que a essência das religiões monoteístas, fundadas na lição de Abrahão da necessidade da submissão a Deus, é substituída pelos socialistas pela submissão ao partido, e submissão iguala escravidão. A salvação é sempre e somente obtida pelo trabalho forçado e sofrimento.
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