Friday, February 13, 2009

Entrevista com Adolfo Sachsida: "Economista Não Foi Feito Para Ser Amado, Mas Para Ser Temido"

O professor de economia da Universidade Católica de Brasilia, Adolfo Sachsida, fez contribuições significativas nas áreas de macroeconomia aberta, economia do trabalho, desenvolvimento econômico e economia do crime e terrorismo. Ele se encontra entre os economistas mais produtivos do Brasil. Na entrevista abaixo ele fala da crise e do papel dos economistas e profissionais de finanças.

1) Qual o papel da incompetência, desonestidade, desconhecimento dos economistas nessa crise?

Resposta) Acho que o nosso papel foi grande em gerar a crise, mas maior ainda em propagá-la. As respostas fornecidas por um grande número de economistas simplesmente contradizia princípios econômicos consagrados, e certamente contribuiu muito para o agravamento da crise em vários países.

Um detalhe que devemos admitir é que um bom número de economistas simplesmente desconhece a teoria. Desconhecem fatos básicos do funcionamento do mercado. Mas isso em si é um mal menor, pior do que o deconhecimento é a incompetência. Incompetente é um indivíduo que além de não ter conhecimento ainda por cima é propenso ao risco. Um exemplo claro disso são os vários recém-graduados em economia que trabalham no mercado financeiro. Converse com eles e você ouvirá os mais completos absurdos ditos com a mais absoluta convicção. Mas o pior mesmo é a imensa desonestidade dos economistas. Desonestidade esta que muitas vezes sacrifica o raciocínio econômico pela visão política, e pelo desejo imenso de agradar algum grupo.

Some-se o desconhecimento, e a incompetência, de alguns economistas de mercado com a desonestidade de vários economistas acadêmicos e teremos um ambiente propício ao desastre econômico que está por vir. Para finalizar meu argumento gostaria de citar dois exemplos: a) Em 1997 Peter Ireland publicou um artigo no Journal of Monetary Economics deixando claro que a política monetária do FED (inclusive sob o comando de Alan Greenspan) tinha dado mais sorte do que juízo. Esse artigo foi solenemente ignorado na literatura (o que é uma surpresa dada a importância do autor, do periódico e do tema abordado). Tivesse esse artigo gerado uma profunda reflexão sobre a política monetária americana, e talvez a crise atual não estaria ocorrendo. Mas os economistas de mercado eram incapazes de compreender a tecnicalidade e as implicações do artigo, e os acadêmicos foram acomodados demais para provocar uma discussão aberta com o até então “gênio” Greenspan; e b) Paul Krugman. Krugman é o exemplo mais claro da desonestidade dos economistas (mas está longe de ser o único). Ele está pronto para a qualquer momento dizer qualquer coisa, desde que isso aumente sua popularidade. Acho que o sonho de Krugman é ganhar o concurso de Miss Simpatia. Mas não devemos achar que Krugman é o único, outro prêmio nobel de economia (e certamente um dos maiores de todos os tempos) também mostrou pouca credibilidade. Refiro-me a Robert Lucas. Lucas assinou um documento CONTRÁRIO a ajuda ao setor financeiro nos moldes propostos por Geithner/Bernanke. Menos de três meses depois Lucas vêm a público dizer que a ajuda estatal nos moldes da sugerida por Bernanke era a menos ruim possível. Mas a lista de desonestos é longa, veja bem: se os editores da American Economic Review publicam sem cessar na revista em que são editores, como podem eles cobrar moralidade de um Secretário do Tesouro ligado a bancos?

No fundo no fundo, o maior problema dos economistas é almejarem ganhar o prêmio de Miss Simpatia. Nossa profissão implica em tomar decisões difíceis, que muitas vezes trarão prejuízos no curto prazo. Quando um economista é bem quisto é porque tem algo errado. Economista não foi feito para ser amado, mas para ser temido.

2) Quais as causas desse problema? São as escolas de pensamento econômico? São as escolas de economia? São os incentivos individuais?

Resposta) São três os problemas principais: a) não há como se negar que economia é uma ciência muito difícil, poucos tem a habilidade de compreendê-la. Entender o arcabouço econômico demanda tempo, dedicação e uma grande dose de raciocínio abstrato. Para se ter uma noção da dificuldade da economia fale com um matemático ou um físico. Você verá que apesar deles terem uma habilidade matemática enorme, geralmente são incapazes de entender conceitos simples de economia tais como a importância do mecanismo de preços (não é coincidência que matemáticos e físicos sejam defensores de economias centralmente planejadas); b) para ensinar economia é necessário antes saber economia, e a maior parte dos professores não sabe. Isso ocorre porque é muito mais fácil culpar o mercado, ou o imperialismo, ou qualquer outro monstro, do que sentar e estudar. Para se protegerem de sua ignorância, tais professores estreitam suas ligações com grupos políticos e defendem a posição desses grupos. Posições essas que na maioria dos casos pouco tem em comum com a teoria econômica; e c) os incentivos favorecem a adoção de posições medianas em detrimento da posição academicamente mais defensável. Veja bem, quando se é um ignorante o melhor é repetir o que a opinião mediana repete. Afinal, esse comportamente minimiza sua chance de ser desmascarado. Contudo, isso gera um bando de economistas apenas SANCIONANDO a opinião pública, ao invés de esclarecê-la na direção correta.

3) Qual e' o papel de financas, como conhecimento, nessa crise? ela criou e/ou agravou a crise?

Resposta) No final do dia eu não culpo o pessoal de finanças, eles são como café-com-leite. Não dá pra levar a sério. Acho que finanças se encaixa bem no perfil do incompetente: é um cara sem conhecimento achando que sabe mais do que todo mundo. Numa economia de mercado eles seriam rapidamente postos para fora. O problema é que nós, os economistas, fizemos de tudo para limitar o mercado. Num mercado limitado, com pouca competição e repleto de legislação específica, criou-se a necessidade de um profissional capaz de entender um pouco de leis e um pouco de matemática. Como os craques em direito e em matemática não ocuparam esse mercado, ele ficou disponível para aquele profissional que sabe um pouco de direito, um pouco de contabilidade, um pouco de matemática, e um pouco de técnica bancária. No Brasil uma pessoa com esse perfil vira funcionário público, nos EUA virou o cara de finanças.

Para ser honesto, o pessoal de finanças não pode ser culpado por nada dessa crise. O motivo é simples: eles fizeram o que era esperado que eles fizessem, ou seja, perderam o dinheiro. A única coisa que me irrita no pessoal de finanças é a choradeira. Não gosto de criança chorona. Note que o pessoal de finanças justificava seu salário mais alto dizendo que eles operavam num ambiente de maior risco. Como é de se esperar, quando se opera num mercado de alto risco um dia você vai perder muito. Foi justamente o que aconteceu. Além disso, para proteção contra sua própria ignorância, o pessoal de finanças sempre apoiava a opinião mediana. Quando esta se mostrou equivocada todos perderam muito dinheiro de uma única vez. Claro que uma pessoa mal intencionada pode dizer então que a crise atual é culpa da incompetência do pessoal de finanças. Eu discordo dessa visão, culpado é quem confiou em pessoas tão despreparadas assim.

4) Você ensinou nos EUA numa business school, qual a sua opinião sobre os profissionais de finanças?

Resposta) 50% do pessoal de finanças é igual ao time do Cruzeiro. O time do Cruzeiro é famoso por pegar jogadores que não deram certo no Rio ou em São Paulo e levar pra lá. Finanças faz o mesmo com economistas, pega economistas que não estão se saindo bem na profissão e levam eles pro departamento de finanças. A outra metade do pessoal de finanças é simplesmente abaixo da crítica. São profissionais incapazes de realizar qualquer coisa parecida com pesquisa acadêmica. Além de lecionar numa Business School também estudei numa outra, e a percepção é a mesma. Pesquisa para um cara de finanças é ficar olhando um gráfico procurando a letra M (é sério!!!).
O nível dos doutores em finanças está tão baixo que eles estão perdendo muito espaço para os economistas, mesmo dentro do departamento de finanças. Esse movimento é tão sério que a associação de classe, que cuida do credenciamento de cursos de finanças, está exigindo uma porcentagem mínima de doutores em finanças para validar o curso. O mesmo ocorre com accounting (contabilidade).
A impressão que tenho de um curso de finanças é que os alunos passam 4 anos lá aprendendo como passar gel no cabelo e como palitar os dentes. Afinal, em finanças eles seguema a máxima de Mark Twain: “É melhor manter sua boca fechada e deixar as pessoas pensarem que você é um tolo do que abrí-la e acabar com as dúvidas”.

5) O Fred vai jogar no Fluminense, ou a diretoria só está fazendo essa palhaçada para irritar o torcedor? O Flu vai ser campeão de alguma coisa esse ano, ou porra nenhuma, as usual?

Resposta) Diretorias só servem para duas coisas: roubar e irritar os torcedores, espero que a do Flu esteja apenas nos irritando. Minha longa experiência em botecos assistindo a jogos de futebol me ensinou uma coisa: 5% do sucesso de um time depende daquilo que os comentaristas falam (habilidade, preparo físico, tática, etc.); outros 5% dependem de sorte pura e simples; os 90% restantes dependem de tradição e pagamento em dia. Tradição o Fluminense tem, falta pagamento em dia. Como a diretoria dos outros times do Rio consegue a proeza de ser pior do que a nossa, creio que é capaz do Fluminense atrasar menos os salários do que os outros. Assim creio que, conforme manda a tradição, o campeonato carioca está no papo. Também acho que o Fluminense tem boas chances na Copa do Brasil. Afinal, um campeonato onde Grêmio e Cruzeiro são os maiores ganhadores não pode ser difícil de vencer. Por fim, se o Flu fizer igual ao São Paulo (isto é, comprar toda comissão de arbitragem) acho que o título de campeão brasileiro também é possível.

4 comments:

  1. Caro SB,

    Muito obrigado pela gentileza da entrevista.

    Adolfo

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  2. Excelente autocrítica profissional Adolfo, parabéns!

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  3. Será que mesmo os economistas "competentes" não estão enganados? Será que a teoria econômica, baseada no equilíbrio geral, não é uma teoria equivocada, ultrapassada...? Por que essa relutância em usar modelos computacionais, se limitando às analises matemática de "papel e caneta"?

    O físico Per Bak quando foi estudar economia imaginou: "na física já existem teorias altamente complexas, nas quais os cálculos não têm como ser resolvidos sem a ajuda de um computador. Na economia, que existe o livre arbítrio dos agentes, deve ser mais complicado ainda." Pra seu susto, não era assim que a banda tocava...

    Não concordo que físicos e matemáticos defendem o mercado planejado. Na verdade os estudos de físicos na economia e finanças atualmente têm justamente concluído que é praticamente impossível fazer previsões no comportamento dos mercados, e previsões corretas são fundamentais pra uma economia planejada.

    Parabéns pelo blog, continue o trabalho!

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